terça-feira, 4 de novembro de 2014

Mente

Perdidamente
Completamente
Serenamente
Vagueia a mente
Vistosamente
Delira a mente
Deliciosamente
Delirantemente
Maliciosamente
Invente
Perdidamente
Perdeu a mente
Pavorosamente
Primorosamente
Periculosamente
Permanentemente
Indecente

Sem poema

Poeminha safadinho
Se escondendo no meio do ninho
Passarinho desaforento
Me levando feito vento.

Poeminha pra dizer
Que dele não sei fazer
De arrepio um verso de brio
De emoção
Poema canção.

domingo, 19 de outubro de 2014

Despedida



Há um tempo que a gente percebe que não tem mais como ficar, precisa partir. Quando o coração se acomoda, como quando a gente deita no sofá. Tem dias que é preciso levantar a âncora e sair. Levantar acampamento, mesmo que dê trabalho juntar as coisas, os trapos, os cacos.

Nunca fui muito de partidas. Sempre preferi as chegadas. Mesmo assim sempre parti. Sento, na partida, mistura de atração e repelia. Sou daquelas que anseia uma viagem, planeja, sonha e anota todos os detalhes por meses, até anos. Mas quando enfim chega o dia da partida: saber-se fora de casa, longe do seguro, distante da rotina é abismo amedrontador. Deparar-se com lugares diferentes, sem saber das paisagens, casas estranhas sem o conforto e a segurança daquilo que a gente chama de lar, seja isso uma casa, uma rua, um trabalho ou um grupo de pessoas. Mas aí já não tem mais volta, o avião já está a decolar. Há que se enfrentar o medo, o abismo, o balançar da corda bamba.

 E mesmo com todo esse medo da partida, continuo eu partindo.Talvez seja esse sentimento tão difícil atraia todos os anos a fazer isso como que a força. Saber-se por alguns (ou muitos) dias longe do seguro, sair do prumo, sair do chão, da âncora, do asfalto, da terra, rumo ao desconhecido, ao solto, às surpresas, ao fato inesperado. Mas como, se eu gosto mesmo é do chão? Talvez a beleza esteja mesmo é nessa contradição.

 E a chegada pode ser tão difícil quanto a partida. Deixa-se uma casa arrumada, as roupas engavetadas, coisas compartimentadas. Parte-se e não sem alguma dor bagunçam-se as gavetas, os cabelos, chacoalham os vidros de perfume, misturam-se as essências. E na volta, tudo há de retornar ao seu lugar. Não, tudo há de tomar um lugar, pois o lugar de antes já não existe mais. Partir também implica perder. Partir significa saber disso tudo, saber das misturas das trocas de gaveta, das mudanças de configuração.Significa trocar as plantas de vaso. E quanta força pode existir em tirar da terra aquela raiz presa, estagnada, vivida e acomodada. Quanta dor deve ser pra planta ser trocada de vaso, mesmo que pra vaso de maior tamanho.  E quando instalada em outro vaso, que sensação de estranheza, pois já não é e ainda não mais raiz. Ainda não se apossou de seu espaço, mas já não pertence mais ao antigo. Se enraizar novamente toma tempo e há de conviver com a sensação de ainda não ser raiz daquela terra, mas de não mais ser da outra. Sensação de fora de casa, sem lar, sem proteção.

Hoje fiz uma partida. Saí de uma das tantas casas que a gente constrói consciente ou inconscientemente nessa vida. Fato é que as vezes essa casa é inacabada, o sofá é confortável, mas o colchão já tomou a forma do corpo... havia algo nela que já não me preenchia mais e não era mais culpa da decoração ou da necessidade de mão de obra pra colocar mais uma prateleira. Simplesmente não estava mais nas minhas mãos, nem das de ninguém. Mas como eu gostava (e ainda gosto) daquela casa... o sofá me servia bem, apesar das dores na coluna. A vista conhecida como casa de mãe, mas sabia que podia ir mais longe. Já tinha percebido há tempos que não podia morar lá, porque aquela casa não tinha chão. E chão é coisa de precisão numa casa. Eu, entre partidas e chegadas, precisava de chão que é porto seguro.

 Fiz uma partida, me libertei pro próximo destino, precisei entregar as chaves da casa e pedir a ela que trocassem a fechadura. Se deixassem a mesma, capaz de eu esquecer das suas faltas e de me deitar novamente no sofá e na vista, só pra sentir aquele conforto de casa de mãe. 

Precisava encontrar casa com chão. Casa sem chão não dá pra colocar tapete, e tapete é coisa que aquece o coração da gente.
Mas esse mesmo coração insistia que casa como aquela não se encontra fácil por aí, que casa boa é aquela que a gente conhece, já está acostumado... Era o bom e velho medo da partida... 

E digo a ele que se lembre, que aquela casa nunca foi só minha. Em verdade nunca foi de meu pertencimento. Ela por mim tinha apreço, gostava das minhas visitas, apesar de não me oferecer chão. E nunca foi propaganda enganosa. Nos classificados já dizia seus defeitos... Mas nas visitas...  era casa, tinha jeito de lar, de lugar que a gente gosta de chegar num final de dia. Me seduziu.

E como casa também sente falta da gente, disse pra ela que ela ia ter que se acostumar, que mais difícil para mim, mas que era em busca de uma casa com chão e que me coubesse, não podia mais com as dores na coluna.  Ela entendeu, mas se entristeceu... sabe das duas limitações, mas preferia continuar contando com as minhas visitas.... sabe que preciso partir.  Mas que um dia volto, só de visita, já instalada na casa com chão. 

Não consegui olhar pra vista antes de partir. Entreguei as chaves. Fechei a porta. 

domingo, 21 de setembro de 2014

Concessão

Como pode coração bater
Sem motivo pra querer
Sem noção do dever?

Como pode quer ser
Mágico anoitecer
Quando fadado é
A nublado amanhecer?

Tentando ser constante
Quando é apenas ser errante,
Eterno volante.

Volante sem guia
Preenche qualquer buraco
Vestindo qualquer fiapo
Aceitando o belo trocado.

 Como consente chão pedrado
Quando sonha com amor guardado?





sábado, 16 de agosto de 2014

Bem querer

Queria que lá fora
 Chovesse como aqui dentro
Queria que pudesse embora assim
Deixar de morrer por dentro

Queria as forças do poço
Da mola que pulsa lá dentro
Queria da gota da chuva
Um pouco do passo que é lento

Queria do sono profundo
Acordar em novo invento
Queria do inverno soturno
Acordar em verão turbulento.

Dias

Tem dias que chove
No fundo, no lado de dentro
Tem dias que nem se move
Profundo, intenso lamento.

Nesses dias se entope
E não há quem prove
Que há vida cá dentro.

Há dias nem mundo remove
Insiste e não se recolhe
Do infinito e mais puro tormento.

domingo, 10 de agosto de 2014

Fora de hora

Encurralada num canto
Atrás do sofá
Debaixo do pano

Esmagado coração
Coloca as botinas
Se estremece no chão

Abre-se a porta de fora
Fecha-se o espaço de dentro
Adentra o mundo lá fora
Finda-se o dito lamento.

Mundo não escolhe hora
Não bate na porta

E sai eu sem demora.


quinta-feira, 19 de junho de 2014

A incrível geração de mulheres que foi criada na contradição.

Realmente, como disse Ruth, não somos criadas para ser o tipo de mulher que o homem quer. Fomos criadas para ser boas profissionais, falar várias línguas, ser pró ativas e principalmente independentes. Não cozinhamos muito bem, mas lemos os clássicos, não sabemos passar roupa, mas lemos os jornais e sabemos tudo o que acontece no mundo. 

Pode parecer absurdo, mas também fomos criadas para casar e ter filhos. Compramos uma imagem de que a felicidade está na vida a dois, ou melhor, a três... de preferência a cinco (um marido, dois filhos e um bichinho de estimação). A casa bem cuidada, o marido feliz, as crianças correndo... não são esses até hoje os comerciais de margarina? Não é esse ainda o final da telenovela?  A mulher conquistou seu espaço, mas a imagem do seu futuro ainda é arraigada em preceitos antigos: casa, casamento, filhos que devem combinar com independência, proatividade, cultura, inteligência. Só de escrever já me sinto sufocada com tantas necessidades. Não seriam contraditórios sonho e realidade? O que buscamos e aquilo com o que sonhamos? 

Serão as mulheres independentes (financeira e emocionalmente) felizes sem uma família nos moldes margarina? Essas mulheres (poderia dizer nós) cresceram  vendo a mídia, a escola, a família e a sociedade venderem para ela a imagem de que esse é o modelo de felicidade."Não quer casar? Não quer ter filhos? Como assim? Em que mundo você vive, mulher?" "Ah, tenho certeza de que isso é uma defesa, que de no fundo esse é seu sonho." 

 Sim, pode ser. Mas na busca pela sua independência, esse sonho pode acabar ficando para trás. Não estaríamos entrando em uma incoerência sem saída?  E não deveríamos admitir que para muitas mulheres sim, esse é um sonho difícil de se conquistar? Devemos então ficar presas a uma imagem de felicidade, frustradas por ter conseguido emprego, independência, liberdade e cultura, e não família e filhos?  Ah...faltou amor... um companheiro pra vida, um amante, um ombro pra descansar... Mas essa necessidade é interna de cada uma, e não tem ligação estreita com família e filhos... pode haver um, dois, três, cinco amores e vinte viagens na vida de uma mulher e ela se sentir feliz, completa e desejante ao mesmo tempo. 

Ainda depois de tanto tempo, nós mulheres, mais do que nunca, vivemos uma contradição sem fim... uma contradição que é tripla: o que queremos, o que devemos querer e o que conseguimos dessa vida. 


sábado, 26 de abril de 2014

Girassol

Dança com passos lentos e delicados
Rodopia como bailarina sozinha no meio do salão.

Plantou várias sementes
Nasceu girassol
Outras se foram
Outras não vingaram
Mas o girassol amarelo
Desabrochou na janela

Volta a brilhar como sol
Volta a dançar
Solta e só no salão.

Mas já não importa
Gira como a flor na janela
E pra girar não precisa de par.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Passo apertado
Corre rumo ao rosto colado
Às mãos espalmadas
Ao traço fechado

Corre o espaço livre
Se fecha em pedaços
Do medo enroscado
Em pedaço descolado.

Mãos que fogem do peito aflito
Carrega dentro de si um apito
Apito não pode parar
Som não pode se espalhar.

Passo apertado
Peito descolado
Espera
Não alcança
Não enxerga
Tropeça.

Não mais enxerga estrada branca
Azul esfumaçado que tomou conta.
Não sabe se ainda se vem dos olhos, ou do caminho.
Se vier dos olhos, nada ainda é findo
Se do caminho
 melhor seguir pelo atalho
rumo ao ponto de partida.

Não quer viver do mesmo
Não quer recair em erro esmo.
Mas parece chave que dobrou a esquina
Botão que não vê mais casa de saída.

Espera, reflete, não descansa.

terça-feira, 25 de março de 2014

Medida

Não falo demais
Não falo de menos
Não lanço os plurais
Não sou de remendos.

Acerto a medida
Comedida nos passos.
Me moldo às rimas
Colando os pedaços.

Não saio do traço
Nem transbordo dos laços
Sou pedra tolhida
Sou sombra ante os espaços.

Polida na vida
Me vigio todos os passos.



domingo, 23 de fevereiro de 2014

Sem Carnaval

Não, não quero carnaval
Minha alma passou do portal.

Não vivo alegria fatal
Me encolho no inverno
Na dor desigual.

Não me espalho como coisa banal
Me recolho com meus cacos
Me despedindo daquilo que foi carnal.

A carne sangra como busca vital
O sangue jorra pela pele
Derramado como a pá de cal.

Não, não quero carnaval
Minha alma passou do ponto
Minha tristeza se recolhe num canto.
Sou pequena, sou murcha
Sem flor, sem cor, sem amor.


Quero meu canto, meu pranto
Quero descanso pra alma que perdeu seu carnaval.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Espera que passa

Espera que passa, menina.
Menina não quer esperar
Não tem tempo a aguardar
Não há esperar pra se guardar.

Menina, seu tempo já foi
Menina dos olhos que já não se vê
Menina que no tempo não crê.

Espera, menina, que passa
O tempo cura e o mal arrasta
Menina que o tempo não esparsa
Menina que o tempo não abraça.

Espera menina, tudo passa.
Na espera o corpo se esgarça
De tanta espera, já não é mais menina
Da esgarça, a alma se finda.

sábado, 18 de janeiro de 2014

Para trás

A indecisão
A espera
O medo
A quimera

Me consome por dentro
A incerteza que me acomete
O espaço que me derrete
O amor que não se promete

Sua ausência me beija
O castelo se despeja

O abraço não dado
O peito apertado
Te espero de lábios colados

Pra que voltes pra mim
Como num dia viestes assim.
Com amor
No passo de trás.