domingo, 27 de setembro de 2009

A (re) espera do fio

Se agarrou naquilo como se fosse sua última esperança. Tinha vivido dias pesados, opacos, quase perdidos. Aquele não. Aquele era a esperança de uma vida renascida, de vida alegre e vivida, de vida que havia vivido e não havia mais. Sabia que era ali que se sentia confortável, por maiores que fossem a pedras, pedras suas, que ela mesma punha no caminho, mas que ali, naquele lugar se sentia confortável e forte para tirar. Era ali, naquele lugar que sentia força e coragem suficiente para voltar atrás, pensar, repensar e agir sem medo de errar. Era ali que era grande, bonita, leve, viva. Então continuou se agarrando como se soubesse que, fora dali não haveria tanta chance. Fora dali era tudo mais incerto, mais deserto, mais bambo. Ali tinha tamanho, altura, estrutura. Fora se sentia como com pouca água, pouco ar, água morna, terra estranha.
Mas sabia da finitude do dia, do momento, daquele espaço onde podia ser. Onde era, onde perdia e se encontrava, lugar assim como casa da gente, quarto, espaço próprio.
Sentia como se tivesse voltado pra casa, lugar de onde nunca deveria ter saído, mas de onde teve que sair, não por vontade própria, mas por conta da vida que vai nos levando por caminhos que trançados e estranhos e quando vemos já estamos lá. E lá estava ela ali, se agarrando num pedacinho de passado confortante, que trazia consigo esperança de um futuro, assim, do jeito que ela queria. Daquele lugar conseguia enxergar um além limpo, livre, sem medo, dela. Dali via, havia jeito, havia esperança.
Mas como todo fio ou galho curto onde se agarra, aquele também se foi, se quebrou. Prometendo voltar dali a um mês ou dois, como mais um fio curto de vida vivida de verdade.
E agora ela, tão certa, tão segura em tantos campos, naquele terreno não sabia mais como agir. Sabia sim que voltaria aqueles dias pesados (talvez dessa vez nem fossem tanto), sem cor, esperando que um dia o fio volte, que o galho renasca ou que o vazio seja preenchido.
Ali estava ela sem esperança alguma. Sem solução alguma. Sem aquela vida ou previsão de vida alguma. Tão deserto como viver sem a esperança era talvez ter seu próprio fio oferecido e negado no instante seguinte. E agora só restava esperar.

sábado, 19 de setembro de 2009

Casa de Vó

Casa de , mesmo vizinha, é coisa de descanso. É olhar a vista pro mar da hora de acordar, ao minuto antes de dormir. É acordar com cheiro de café pronto e mesa posta. É pão já na torradeira. Morar na casa de é compania e preocupação constante. É cuidado intenso que não termina nem ao apagar das luzes, pois a dela, do quarto, nunca se apaga. Fica sempre aquela luzinha que entra por debaixo da fresta da porta.
Casa de é encanto eterno de cuidado materno, voterno. É não poder andar com pé descalço, não ficar na linha do vento, não pegar friagem, menina!
É doce quentinho da padaria, mesmo durante a dieta. É despojamento completo mesmo nos dias em que não se quer sair da cama.
Casa de é barulho de passarinho na janela, cheiro de bolo de tangerina, arroz fresquinho, barulho de chuva.
Casa de é ter as vontades adivinhadas, surpreendidas, pensamentos lidos, carinho e compania antecipados.
É espaço grande pra dormir, pra sonhar, pra descansar. É cama firme, macia, segura.
Casa de , da minha avó, é que dá mesmo vontade de ficar.