sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Exercício de Coletividade

Andar de ônibus no Rio de Janeiro pode ser um exercício de paciência melhor do que qualquer técnica oriental. Além disso, serve também como exercício de democracia, coletividade e, por que não, de serenidade.
Em primeiro lugar, você tem que ter a sorte do ônibus que vai te transportar ao seu destino não ser um daqueles mitos, como o 524 ou o 584. Não sendo, você deve esperar que o motorista tenha a bondade de passar pelo ponto por dentro, parando exatamente aonde tem aquela plaquinha com o deseinho do ônibus, sabe? Caso contrário reze, feche o corpo e se jogue no asfalto em busca do seu ônibus quase perdido.
No caso do seu ônibus ser um daqueles mitos já descritos acima, bom... não pense duas vezes, se jogue no asfalto!
Já dentro do ônibus, você tem que aprender a não se preocupar com a hora. O motorista do 157 não se preocupa com ela, vai andando devagariiiiinho, assim como quem passeia pela orla de copacabana num domingo de sol. Os demais vão parando em todos os pontos onde parece ter alguém e aí, chega o ponto do fiscal. Meu querido leitor, apele para todos os santos, para não haver um fiscal o seu caminho num dia de pressa. O nosso querido amigo motorista pára, fala "trinta e três", pergunta o resultado do jogo do flamengo, comenta a comida que a patroa mandou pra ele, enfim, e lá se foi aquele sinal aberto que você tanto precisava passar.
Mais um ponto. Ele para. Aparece aquela senhorinha perguntando:
- Passa na N. Sra da paz?
- Passa, responde o motorista.
- Naquela praça da Igreja? Pergunta novamente a senhorinha enquanto o onibus está parado para que ela se resolva.
- Sim senhora, na praça da Igreja.
- Ah tá, ela responde, deixa de entrar no ônibus e mais uma sinal foi perdido.
Quando você acha que finalmente começou a andar de maneira decente, entra no coletivo aquele grupo de turistas, com suas mochilas. O primeiro na fila pára a roleta para abrir a bolsa, tirar a carteira, o dinheiro e contá-lo devagarinho. Atrás dele, diversos outros turistas querendo entrar, e, é claro, o seu ônibus parado.
Com todas essas paradas citadas, um percurso que duraria quinze minutos, passa a durar meia hora. Claro que eu não estou contando com o trânsito, que é figurinha fácil nas ruas do Rio de uns anos pra cá. Mas esse assunto já foi devidamente citado, descrito e esperneado nesse blog.
Bom, você está sentado na sua poltrona, tentando manter a calma com as milhares de paradas que o ônibus dá, olha para os lados, tenta ver a paisagem, ouve uma música e, quando já está perto do seu ponto, senta alguém cheio de malas e bolsas do seu lado. Parece lei de Murph, e é.
Você respira fundo, levanta com toda a calma possível depois de uma viagem como essas, tenta apertar o botão, mas estão todos bom aquele esparadrapo isolante. O ponto está chegando, você corre, pula e alcança a cordinha. Não, o motorista não parou no seu ponto, ali aquele ônibus não faz ponto.
Mais uma vez, você respira fundo e desce.

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