sexta-feira, 24 de julho de 2009

Pequena das pernas curtas

Saiu procurando um lugar para se esconder, um lugar para se encontrar. Achava o mundo daquelas rodas gigantes, que rodavam sem parar mas que ela não conseguia alcançar. Se sentia sozinha, perdida, diferente, indiferente. Corria para alcançar os lugares dentro da roda. Perdia a corrida, cansava de lutar. Chorava sentada na cama, procurando um lugar para não ficar, um não estar perdido como esse. Queria estar, ser, mas gostava mesmo era do verbo pertencer. Nada lhe cabia tão bem quanto pertencer. Pertencer ao vagão azul do trem, à cabine número 343 da roda gigante. Mas seus pertencimentos haviam se esvaziado no tempo. A roda tinha girado demais. Perdeu tempo, perdeu espaço, perdeu o lugar. Ou então seu espaço estava ali, no topo da roda gigante. Tentava seguir no seu fluxo, no seu caminho, sem se preocupar com a velocidade que ia. Mas não conseguir. Queria aquele vagão, o 343. Queria pertencer à ele, assim como ao vagão azul do trem. Outro que lhe dessem não tinha tanta graça nem tamanha importância capaz de lhe preencher. Queria ser do azul. O verde não lhe caía bem.
Continuava a se sentir diferente, pequena diante da imensa roda, pior. Pior sim, pois não havia conseguido alcançar o vagão lá em cima. Corria devagar, suas pernas eram curtas. Sentiu raiva por não poder ser como os outros, por não achar o seu lugar no mundo. Temia que os outros rissem dela, a achassem diferente; pequena, das pernas curtas.
Tentava gritar ao mundo tamanha injustiça não conseguir alcançar o vagão de cima. Queria que o mundo se compadecesse de sua dor. Mas ele assim não o fazia, não obedecia suas ordens como tanto queria. E de que adiantaria gritar e chorar ao mundo se a ele nada cabia fazer para aumentar o tamanho de suas pernas. Talvez devesse se conformar em entrar no vagão 24, ou no 32, ou pudera passear entre tantos vagões de baixo para descobrir em qual se sente melhor. Ou conseguir ser assim, feliz e aceita em qualquer vagão que entrasse. Mas ainda assim suas pernas curtas lhe doíam.
Talvez devesse procurar, não aumentar o tamanho de suas pernas ou culpar o deus do universo por elas, tinha de saber viver no chão e não no alto.

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